domingo, 10 de maio de 2009

Pra esperar quem vem de fora

Os preparativos dentro e fora do Centro de Eventos

A menos de um mês, mais precisamente a 24 dias, do início da 17ª edição da Feira Nacional do Doce – a Fenadoce – Pelotas começa a se envolver com a atmosfera do maior evento do calendário do município. A movimentação em torno da feira começa no Centro de Eventos e se expande por toda a cidade, seja na forma de formigas gigantes que mais uma vez marcarão a trilha que leva a vários pontos do centro, ou como promoções e oportunidades de consumo e trabalho. A Fenadoce vem aí. Estamos preparados?

Para diversos empresários e gestores do setor de turismo é praticamente uma unanimidade a opinião de que se amadureceu muito, mas apesar da experiência adquirida nas 16 edições anteriores a cidade ainda não consolidou todo o potencial turístico da Fenadoce.

Enquanto no interior do Centro de Eventos o clima é de aceleração nas obras de infra-estrutura, preparação dos estandes e confecção dos bonecos e alegorias que farão parte dos desfiles temáticos – principal novidade da feira este ano, do lado de fora a cidade que procura alcançar a excelência em turismo ainda se prepara a passos lentos, ou atrapalhados.

As secretarias municipais de Turismo e de Urbanismo prometem fazer o básico: a de Urbanismo irá providenciar o embelezamento urbano, especialmente no Calçadão, com plantio de flores e pinturas, enquanto a de Turismo corre para checar a manutenção da sinalização e para organizar dois novos postos de informações – um na Fenadoce e outro no centro, além dos que já funcionam na Rodoviária e no Parque da Baronesa. Isso, entretanto, ainda emperra em uma liminar da justiça que restringe a contratação de estagiários para atenderem nesses postos e também na definição do local de instalação do ponto de atendimento na área central.

Além disso, segundo o titular da pasta, Marcelo Mazza Terra, a secretaria ainda tenta, antecipadamente, realizar um levantamento das atrações que Pelotas terá para oferecer fora do Centro de Eventos durante os dias da Fenadoce a fim de recepcionar os turistas com mais opções.
E é justamente nesse ponto que falta consenso: enquanto os gestores públicos cobram uma maior mobilização por parte dos empresários, boa parte dos empresários queixa-se que a Fenadoce se concentra apenas no Centro de Eventos e os organizadores da Feira rebatem dizendo que são eles – os proprietários de bares, restaurantes, locais de visitação, etc – que devem atrair o público do Centro de Eventos para dentro da cidade, e ainda cobram maior envolvimento do poder público. Em outras palavras, o desenvolvimento do turismo local esbarra, mais uma vez, na falta de uma ação coordenada.

Para a presidente do Pelotas Convention & Visitors Bureau, Cristiane Hallal, um passo importante seria a inclusão de profissionais de turismo no quadro de funcionários da Prefeitura. Uma forma de garantir a implantação de um projeto de gestão do turismo a longo prazo. “Assim o turismo deixaria de ser uma prioridade de governo e passaria a ser uma prioridade do município”, destaca.

Até lá, entretanto, ainda há muito o que fazer e os turistas não esperam: com reservas em hotéis feitas e excursões agendadas eles estão a meio caminho andado.


“Gargalo” de crescimento

O sabor, as belezas e o patrimônio histórico e cultural de Pelotas costumam chamar a atenção de gente de várias partes do Brasil e até de fora do País. Mas, é de cidades do Rio Grande do Sul situadas em um raio de 300 quilômetros a partir de Pelotas que vem a maior parte dos turistas que visitam a Fenadoce. A feira tem um público crescente e recebe em média 340 mil visitantes a cada ano.

Gilcéia Bender, a Téia, é responsável pela recepção dos visitantes da Fenadoce há 7 edições. Em eventos como o Festival de Turismo de Gramado e através de lista de e-mail ela faz contatos com mais de 400 agências de turismo do Brasil e do Mercosul para intensificar a divulgação da feira e tentar assim incluir Pelotas no roteiro dos pacotes de viagens. Este ano a feira oferece um atrativo a mais para essas empresas, que ficarão com 20% do valor dos ingressos pagos pelos grupos. Pela grande procura, a expectativa é de que o número de excursões este ano seja de 10 a 20% maior em relação ao ano passado quando pelo menos 600 ônibus desembarcaram no Centro de Eventos. Nas agências de turismo receptivo, a Fenadoce chega a representar um incremento de 40% na demanda de serviços em relação aos meses de baixa temporada e é a melhor época do ano para o setor.

No entanto, para acomodar esse grande público esperado os espaços são disputados. A rede hoteleira de Pelotas tem capacidade para hospedar pouco mais de 1,5 mil pessoas. O número ainda pode aumentar com mais 75 novos quartos do hotel que deve ser inaugurado antes do mês de junho. Mesmo assim, ainda é pouco e já tem gente desistindo de visitar a feira por não ter onde se hospedar, segundo a proprietária de uma agência de turismo receptivo, Elva Baehr da Silva. “Isso sem contar outros constrangimentos que os turistas passam por causa da falta de qualificação dos serviços. Não há incentivo do poder público nem união no setor do turismo”, lamenta.

De acordo com o Pelotas Convention Buerau, o problema é que a procura se concentra muito nos três finais de semana da feira, enquanto entre as segundas e quintas-feiras a demanda ainda está longe de ocupar a capacidade máxima de lotação dos hotéis. “Pelo menos 10 eventos paralelos estão agendados para o período da Fenadoce. Todos querem marcar na mesma data para que quem vem de fora aproveite para visitar a feira”, afirma Cristiane Hallal.

Marcelo Mazza Terra é otimista: “A capacidade hoteleira é atualmente o limite de crescimento da Fenadoce, mas esse é um problema estrutural do mercado que tem solução e pode despertar nos empresários boas oportunidades para novos empreendimentos”.

Mas, ao mesmo tempo, não há interesse por parte dos empresários do ramo da hotelaria em ampliar muito a capacidade se durante o restante do ano a demanda for baixa, apesar do crescimento registrado pelo setor na carona do desenvolvimento da região.


Souvenir

Empresários, micro-empresários e representantes de organizações que tenham algo a oferecer para os turistas – um produto ou serviço – têm várias formas de fazer com que os visitantes fiquem sabendo. Os hotéis costumam disponibilizar aos hóspedes material impresso informativo, que também pode ser entregue nos postos de informações turísticas da Prefeitura. No site da secretaria de turismo ou por e-mail (ste@pelotas.com.br) é possível cadastrar eventos para serem divulgados.

A falta de informações, no entanto, não é o único impedimento para os visitantes dispostos a conhecer as atrações do município. A má adequação dos horários de visitação de muitos locais (que não funcionam aos finais de semana, por exemplo) é outra queixa frequente, e que deixa a péssima impressão de portas fechadas, e a vontade de conhecer por dentro as belezas do patrimônio local.

Para completar a lista de itens “espanta-turista” aparecem também os “azuizinhos”, que segundo empresários chegam a multar veículos em embarque ou desembarque na frente dos hotéis. Para o secretário de Turismo, é possível tratar melhor os visitantes, especialmente os estrangeiros que podem não conhecer as leis de trânsito daqui, “o que não se pode é permitir abusos”.


Prontos para receber?

A Fenadoce gera mais de 300 empregos diretos. Seis são para a função de recepcionistas. A equipe comandada por Téia teve até 14 pessoas em anos anteriores. Segundo ela, o quadro mais enxuto adotado há três edições se deve à mudança na dinâmica de trabalho. Ao invés de postos de informações em todas as entradas, agora os recepcionistas atendem os visitantes em um único guichê central.

Quem ocupa esses postos de trabalho são estudantes de turismo. E apesar deles serem muitos na cidade nem sempre é fácil encontrar pessoal capacitado para o trabalho. “A maior dificuldade é encontrar alguém que atenda todos os requisitos”, confirma Téia. Ser bilingue, por exemplo, com fluência em espanhol e ter disponibilidade para trabalhar em turno integral durante 19 dias seguidos são itens quase sempre incompatíveis: se o candidato preenche um dos critérios normalmente não preenche o outro.

Nas empresas de prestação de serviço as queixas por falta de mão-de-obra é quase a mesma. “Há muita carência e às vezes o problema não é nem falta de treinamento, mas falta de uma ‘visão de negócios’ e de uma percepção de que as pessoas que estão aqui não vieram somente a passeio”, diz Cristiane Hallal.

Para qualificar os funcionários, o Pelotas Convention Bureau ainda irá realizar até a Fenadoce cursos para funcionários do setor de turismo. Os recursos para isso vêm da taxa de turismo cobrada pelos hotéis, principal fonte de fundos da associação que conta com 32 mantenedores entre hotéis, bares, restaurantes, empresas organizadoras de eventos e agências de turismo. O valor da taxa é convencionado de acordo com o panorama da economia de cada cidade. Em Pelotas o valor é de R$ 1,00 por apartamento ou por pessoa (a forma de cobrança é definida pelo hotel) enquando em cidades como Porto Alegre custa em torno de R$ 3,00. “A gente ainda tem mania de ter vergonha de cobrar e acha que tratar bem o turista é dar as coisas de graça. Mas o que encanta o visitante não é pagar pouco, é pagar bem. Ter uma coisa boa por um preço justo”, defende Cristiane.

O Bureau tem um cartão de benefícios que é entregue no hotel, através do qual os associados oferecem vantagens, como forma de incentivar o visitante a utilizar os serviços dessas empresas. Mas as vantagens, segundo a própria presidente da organização, estão defazadas e devem passar por reformulações em breve: atualmente variam desde uma taça de champagne cortesia a descontos de 10% para a compra de doces.


Reflexos na economia

Que o turismo movimenta diversos setores da economia, é verdade. Mas também é inegável que uma feira do porte da Fenadoce representa uma concorrência direta para o comércio local, em curto prazo. Entre os 450 estandes que estarão na 17ª Fenadoce, quase a metade, 44%, será ocupada por expositores de fora de Pelotas.

O Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas) não calcula a queda de vendas no período, mas a queixa é praticamente consensual, embora alguns segmentos específicos do mercado cheguem até a indicar crescimento.

Na avaliação do presidente do Sindilojas, Renzo Antonioli, tanto a Fenadoce quanto os lojistas em geral são reféns da baixa renda per capta da população pelotense.

E ele parece ter razão. De acordo com dados do Instituto de Pesquisa e Assessoria (Itepa) calculados com base no índice INPC, a renda média per capita do pelotense é R$ 747,00 mensais. Deste valor menos de 10% é gasto em itens supérfulos – saldo que pode ser transferido, em parte, de compras no Calçadão para gastos na Fenadoce.

Ainda que os organizadores da Feira afirmem que o ingresso a R$ 5,00 é o mínimo para viabilizar o evento, o gastos para visitar a Fenadoce – que incluem ainda transporte, alimentação e compras – acabam pesando no orçamento da maior parte das famílias de Pelotas. “O pelotense em geral não tem dinheiro para fazer as duas coisas: comprar no comércio e visitar a Fenadoce”, analisa Antonioli.

Mas, segundo o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Ricardo Jouglard, essa situação não pode ser analizada a curtíssimo prazo. “Levar o turista para o centro não é vantagem porque lá ele vai encontrar lojas e produtos iguais aos que tem na cidade dele. O ganho da Fenadoce para a economia da cidade a longo prazo é muito maior. As perdas se recuperam com muito ganho nos meses subsequentes”, afirma.

Como alternativa para manter os consumidores atraídos para o centro, mais uma vez será realizada a promoção Promove Pelotas, que este ano irá dar um caminhão de prêmios para o autor da melhor tira em quadrinhos.

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