quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Helicópteros no Parque Dom Antônio Zattera

Esta noite, quando eu voltava a pé pra casa, passando pelo Parque Dom Antônio Zattera, encontrei algo que fez germinar na minha cabeça memórias da infância. Lembram aquelas sementinhas com uma “asa”, ou “hélice”, que quando se joga para cima cai rodopiando?

Nunca fui boa em botânica, não sei o que brota dali. Mas eu as chamava de “sementes de helicóptero”. Meu irmão dizia "helipcópteros", dificultando com mais uma conssoante uma palavra já complexa para o vocabulário de uma criança quase quatro anos mais nova que eu.

A calçada era um heliporto repleto, com quantos helicópteros cada um pudesse carregar no bolso formado pela camiseta dobrada na barriga, ou conseguisse juntar no tempo da pressa da minha mãe. Gostava de juntar no chão da praça da Santa Casa sempre que acompanhava ela ao centro, para depois brincar no pátio de casa.

Aí ficava tonta de tanto girar em volta, tentando acompanhar a trajetória com os olhos e segurá-las no ar antes do pouso, até que elas se quebrassem de tal forma que a aerodinâmica fosse comprometida.

Será que alguém ainda brinca disso?

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Volátil

Por que às vezes mudo da água pro vinho?
Da alegria para a tristeza,
Caio em depressão
Se me revolto é por frustração,
Se me desfaço, faço confusão

Às vezes sinto frio, outras arrepio...
Calor...
Vontade de ficar, vontade de sair,
Vontade de chorar, vontade de rir
Vontade de dançar

Porque às vezes estou contigo,
outras não

E sempre acho que não tem mais jeito...

O que eu fiz pra te merecer?
O que posso fazer pra te merecer?
Será que mereço?

Crônica das palavras prostituídas

Confesso: sexo verbal sempre esteve entre as minhas preliminares favoritas. E mais: sempre tive as palavras mais como amantes que como amigas. Palavras são traiçoeiras, mas confio mais no que está escrito que em quem escreve, no que está dito do que em quem diz.

Apesar disso, se não merece a cumplicidade e a fidelidade de uma relação de amor ou amizade, acredito que cada palavra mereça, ao menos, ser cobiçada, conquistada, desejada como amante. Mas, prostituída?!

Vejo palavras jogadas sem qualquer tesão sobre páginas brancas em monitores encardidos, cor de lençol de motel barato. Amontoam-se várias ali, sem qualquer afinidade, faz-se uma orgia e tem-se um release. Depois, são lidas sem paixão, tão banalizadas quanto o sexo nos dias de hoje, vazias, usadas. São exibidas ao leitor como filme pornô de quinta em comercial de canal pay-per-veiw. Basta ler um trecho para entender o vazio contexto geral. E se for release político, então, vira pornô chanchada.

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A maior parte do que leio durante o dia é droga. Se a realidade é feia, ou não faz sentido algum, quem escreve tais relatos também é desprovido de talentos. Por isso quando chego em casa para o abraço dos cobertores prefiro ler ficção, ou documentários de autores bem escolhidos. Busco a poesia para encontrar no sono um sonho bom. Acordo com sede de mais histórias bem contadas.

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Em certos dias queria ser Carpinejar, a voz contemporânea do amor. Melhor ser escritor que jornalista, ao menos os escritores têm licença poética. Queria falar o que a maioria cala – o que eu calo – mas, para isso, precisaria sofrer como todos sofrem. Escrever pode ser perigoso...

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Noite dessas a leitura repetida quase sempre antes de dormir foi suspensa pela sensação gelada nas pontas dos dedos. A sensação de não sentir.

Até que uma brisa de inspiração que entra por baixo dos cobertores me fez sair da cama em busca de papel e caneta para não correr o risco de esquecer as palavras ao amanhecer. Perdi o papel onde rascunhei esta crônica. Tento aqui recordar o que escrevi, em garranchos sem seguir as linhas sonolentas.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Rumo ao 14° endereço

Três tentativas mal miradas de desligar a TV (os singles estavam provocando interferência nos pensamentos) e aqui vamos nós outra vez. Se bem me lembro, o último post antes desse falava de mudanças... Agora volto para mais uma. Por que será que as mudanças me inspiram e me trazem até aqui?

Tem gente que odeia mudar. De casa, de endereço. Já troquei de cidade, de estado, e cá estou com alguns traumas, muitas saudades e um bom punhado de histórias que gosto de lembrar e recontar. Vou de casa para apartamento, 'de escada pra elevador', quase sempre embalada por uma empolgação que sempre toma conta de mim quando uma nova mudança se aproxima.

Ah, dragão galático eu sou, sempre pronta para um recomeço, para um novo pontapé inicial. Bom é criar. A continuidade me entedia. Mas não para tudo, claro. Há certas bases que garantem a possibilidade das criações e certas continuidades que inspiram. Sou a favor da convivência a dois, por exemplo, sempre renovada, arejada, mas eterna enquanto dure.

Gosto de mudar de lugar, de casa, de roupa, de emprego... Quase não sinto saudade do que me desfaço porque tudo o que realmente preciso comigo guardo em mim. Sinto saudade mesmo é do tempo e de algumas pessoas que hoje não estão mais comigo, ou não tão perto quanto eu gostaria. E, às vezes, até confesso, sinto saudade de mim em outros tempos, embora se pudesse escolher entre tantas que já fui para ser hoje, seria eu mesma.

Agora mal posso esperar para recomeçar o ritual: encaixotar coisas, jogar outras fora, deixar para trás coisas velhas, quebradas, que não uso, e levar para o novo endereço os planos - para o próximo final de semana, o próximo mês, até o final do ano e para o resto da vida... Se não me falham as contas, esse será o meu 14° endereço, contando um que eu morei duas vezes. Vai ser a terceira vez não consecutiva que resido na mesma rua. Estou ficando craque em especulação imobiliária.

A decoração vai ter um pouco do que já tenho e gosto, não mais o que desgosto, e alguns novos toques. Tudo muito simples, mas como é bom arrumar casa nova!

segunda-feira, 8 de março de 2010

Capítulo de um livro que provavelmente nunca será escrito ou, o diário interrompido no dia 1

Agora as ideias únicas e solitárias que estavam há tempos entaladas na garganta saem de mim aos tropeços, pelas pontas dos dedos, misturadas com outros sabores engasgados que tenho experimentado. Que seja completa a digestão.

Num fim de tarde destes, quando voltava para casa pela Avenida Bento Gonçalves, vi na ação de uma menina a personificação de uma inquietude minha. A criança, interrompida de suas brincadeiras e distrações no parque, gritava em um tom de quase pânico para a mãe, sentada há poucos metros de distância: - Mãe! Olha! Uma arã...

Parou de súbito enquanto apontava para o “monstro” preto com várias patas no chão, quase aos seus pés, irreconhecível e assustadoramente vivo. Tentou de novo, aos berros, nomeá-lo: - Uma arã...

Engasgou. Não sabia o que o bicho era, mas sabia que não era uma aranha. E a falta da palavra para denominar o conceito tornava o animal asquerozo ainda mais assustador. A angústia de não dizer, de não ter como dizer, era ainda mais angustiante que a presença do bicho, e paralisava a menina, dedo apontado para o chão, intrigada. Como se a falta de palavras para nominar a causa do medo também provocasse a falta de pernas para correr dali e superar a apatia.

Hoje voltei a pensar nessa cena quando despertei de uma incursão literária, sobressaltada, duas paradas depois do ponto em que eu deveria ter descido do ônibus para ir ao trabalho. A relação com as profecias da obra-prima de George Orwell, 1984, foi inevitável. Pensando bem, depois de tanto tempo sem escrever, sinto-me um pouco como o herói Winston Smith ao rabiscar anotações na primeira página de seu diário. Ele na sua transgressão, eu na minha. Esse texto foi escrito ao sabor de chocolate (daqueles com maior concentração da cacau).

Como ele, sinto falta de palavras. Sinto fome e vontade de saborear um bom texto e sinto falta do tempo em que eu viajava buscando as melhores composições para contar histórias. Eu contava histórias, e até acreditava que eram boas. Agora tenho me alimentado da carne dura dos releases e de insossas notas de reclamações sobre o caos no serviço público e suas meias porções de informações. Fora do trabalho, saboreio com veracidade os verbos, substantivos, adjetivos, advérbios... palavras de todas as classes que tenho encontrado nos livros onde busco me nutrir com uma alimentação mais rica que pobres leads. Tenho buscado ler e reler os clássicos.

Mesmo assim, sinto tristemente que, em pouco tempo, vou aprender fluentemente um dialeto parecido com o Novafala, a linguagem oficial da ditadura profetizada por Orwell, tão vazia de sentido quanto certas notícias que se vêem por aí.

Respiro fundo. Hoje é o dia um de mais um recomeço. Um de muitos que já passaram e de muitos outros que virão. Sinto falta dos que me são queridos e daqueles que há pouco tempo estavam tão perto e agora estão longe, se afastando cada vez mais. Mas, pelo menos só por hoje, eu prefiro a solidão.

Provavelmente passarei por mais um bom tempo sem dar as caras por aqui. Só volto quando preciso de refúgio. Depois do desabafo, ponho meu melhor sorriso no rosto e saio por aí, com discreta displicência, até que tenha o ânimo renovado. Foi um prazer, de novo, editar um texto meu ao sabor de chocolate (literalmente).

Este é apenas um capítulo, talvez o primeiro, de um livro que provavelmente nunca será escrito. Às favas, Grande Irmão!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

A linha

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segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Passando a limpo

Uma das coisas que mais lembro de ouvir minha mãe falar é "passa a régua". A expressão, sempre dita em tom apaziguador e conselheiro, sempre foi utilizada em situações críticas das mais diversas, fosse para colocar fim às brigas com meus irmãos na infância, para superar as primeiras frustrações na adolescência ou os desentendimentos no trabalho, já na fase "adulta".

"Passa a régua", a mãe dizia, lembrando um hábito de organização do tempo em que se usava caderno: a lição, no fundo, era esta: nem sempre é possível apagar o passado - e às vezes isso nem é bom. Melhor é passar uma linha reta embaixo, sublinhar o erro, e começar a reescrever.

Hoje é um dia desses, de passar a limpo. Segunda-feira é dia de começar regime, começar a fazer exercícios, colocar a casa em ordem.

Minha dieta continua a mesma, a chuva desestimulou minha ida inaugural à academia, mas está tudo diferente.

Dormi até tarde depois de um final de semana de exaustivo descanso. Por alguns dias, fora algumas pendências, eu não tenho horários, nem tenho que ir trabalhar. A situação é provisória. Em breve, muito em breve, os pelotenses saberão notícias minhas, literalmente.

Por enquanto, aproveito para "passar a régua", colocar a vida em ordem. Resolvi estender a arrumação também para a vida digital, com a qual eu andava bem relapsa nos últimos tempos, e até já havia comentado sobre isto aqui e ali.

Ando revendo contatos, selecionando os úteis, categorizando, atualizando meus perfis e até repensando quem sou...

Minha volta a este blog era inevitável, e já esperada por mim há algum tempo.
Andei pensando em voltar a escrever coisas que tenho vontade, agora que a vontade vai se juntar ao tempo. Pensei em criar outro blog. Por outro lado, já estou acostumada a este espaço, adaptado às minhas indagações/divagações. Penso em torná-lo melhor, mais agradável. Mas para quê apagar o tanto que já foi escrito? Não que este conteúdo seja de grande valia, ou primorosa qualidade literária. Mas trata-se da minha memória, afinal, e para mim seria um desperdício pessoal.

Na prática, o blog é um dos únicos registros digitais acessíveis com facilidade de boa parte da minha produção durante a agora encerrada passagem pelo jornal Diário Popular (meu arquivo de certo período foi apagado), mas tem ainda muito mais que isso.

E sendo assim, porque não, apenas, "passar a régua"? Subscrevo-me na forma de linha, sem saber exatamente o que será escrito a seguir.

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